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terça-feira, julho 22, 2008

Robin dos Bosques, esse mito

Jornal Água&Ambiente
Resposta às questões colocadas pela jornalista Ana Sofia Vasconcelos, em 08/07/07
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P1 - Em que consiste a taxa «Robin dos Bosques» e como funciona?
R1 – Ao que parece, a dita taxa recairá sobre os lucros das empresas petrolíferos, isto é, incidirá sobre as mais-valias geradas pela subida dos preços dos combustíveis. Isto implica assumir que os preços praticados não são reflexo imediato dos custos de exploração, incluindo os que decorrem da aquisição da matéria-prima. A ser assim, trata-se de um imposto sobre os resultados de exploração que difere do modelo comum de taxação das empresas por ser sectorialmente enviesado. Se quer que lhe diga, é uma ideia algo estranha no quadro de valores do presente, onde a equidade de tratamento fiscal tende a impor-se, em teoria.

P2 - Em que países já está instaurada? Como tem corrido a instauração destataxa nesses países?
R2 – Curiosamente, parece que a ideia nasceu na Itália do senhor Berlusconi. Não sei se da sua própria cabeça, o que não me sugere que lhe dê grande credibilidade. Tanto quanto sei, ninguém está a aplicá-la, se exceptuarmos umas ameaças que terão surgido em França e em Portugal, nos últimos dias. Isso não significa que não haja grande controvérsia na União Europeia em torno dos níveis de imposição fiscal sobre as empresas, decorrente das taxas médias bastante diferenciadas que vigoram de país para país. Outro tanto acontece com a temática da taxação dos lucros repatriados, associados a operações fora de portas, particularmente nos Estados Unidos da América.

P3 - Não poderá ser perversa esta taxa, na medida em que estará apenas a incentivar um maior consumo de combustíveis (nas famílias que serão «ajudadas»), em vez de estimular a procura e o investimento em soluções alternativas?
R3 – Não vejo que relação possa querer estabelecer entre taxação dos lucros das empresas do sector dos combustíveis e o consumo destes por parte das famílias com rendimentos mais baixos. Os combustíveis não vão baixar de preço por isso. O Estado poderia era usar o suposto acréscimo de receita fiscal para desenvolver políticas sociais mais efectivas. Poderia, digo, se essa fosse a orientação política do governo.
Obviamente, nada disto se confunde com a exigência das autoridades da concorrência de manterem acções continuadas e rigorosas de verificação da não existência de práticas de conluio entre operadores, com consequências nos preços finais dos combustíveis. Outra coisa é, também, a implementação de políticas activas de promoção do uso de energias alternativas e de veículos energeticamente mais eficientes. Nesta perspectiva, os preços elevados dos combustíveis fósseis serão, porventura, de onde virá o maior estímulo para o desenvolvimento de soluções alternativas.

P4 - Pensa que é uma solução adequada e que será eficaz no nosso País?
R4 – Olhando para dentro de portas, eu diria que a ênfase que nesta altura possa ser posta na ideia da penalização dos lucros “excessivos” auferidas por alguns grupos económicos ou empresas, ou na necessidade do desenvolvimento de políticas visando apoiar alguns sectores mais frágeis da nossa sociedade, não pode esquecer que estamos a pouco mais de um ano das eleições. E não pode esquecer, igualmente, as muitas mal-feitorias praticadas por este e outros governos recentes no domínio da saúde, da educação, da protecção social. Eficaz seria pensar e implementar um projecto para o país, com os portugueses. Isso é, todavia, muito mais exigente do que equilibrar, a curto-prazo, as finanças públicas e implica muito mais visão, diálogo, altruísmo, liderança.

P5 – Que outras alternativas haveria para esta taxa?
R5 – A alternativa à factura energética ditada pela evolução dos preços dos combustíveis fósseis é o recurso crescente a formas alternativas de energia - solar, eólica, biomassa, bio-combustíveis, hidráulica -, o desenvolvimento de veículos, motores e edifícios energiticamente mais eficientes, e a criação de um novo modelo de transporte público. A alternativa para a fragilidade de poder de compra que atinge uma parte crescente dos portugueses é a aposta no crescimento económico do país, com políticas adequadas de estímulo ao investimento e à reestruturação do tecido produtivo, e políticas sociais efectivas e coerentes, que quebrem com lógicas avulsas e de oportunidade eleitoral.

J. Cadima Ribeiro

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